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Maarten Janssen, 2014-

Visualização das frases

[1760-1769]. Carta de Maria, aliás, Maricas, para Gabriel de Mira, padre.

ResumoA autora escreve a Gabriel de Mira a dizer que lhe faleceu a mãe e que, por isso, não escrevia há algum tempo.
Autor(es) Maria, aliás, Maricas
Destinatário(s) Gabriel de Mira            
De Portugal, Viana do Castelo
Para Portugal, Porto
Contexto

Gabriel de Mira, de Lérida, Catalunha, padre com hábito de S. Pedro morador na Covilhã, é acusado de manter uma relação amorosa com Maria, de alcunha ‘Maricas’, mulher casada de Viana do Castelo. O padre Gabriel é mal querido na comunidade local: entre outros, testemunham contra ele o padre Clemente José Viegas, que se queixa de injúrias e ameaças de morte do réu, e o Capitão João Caldúria, que o associa a uma “conjuração” para denegrir e afastar um juiz. Ambos procuram pôr a descoberto as relações privilegiadas do padre, através das quais obteria favores, manteria o cargo contra o que a sua conduta reprovável recomendaria e auferiria dinheiro de crentes “alheios”. Outras testemunhas referem a sua displicente prática (curtos sermões e absolvições tão breves que valeram que se criasse a expressão “o Padre Gabriel te valha!” em casos de dívida de fé particularmente complicada) e o gosto pela bebida, em que não raro acompanhava cristãos-novos. As cartas transcritas, que lhe foram apreendidas e constituem no processo corpo de delito garante da veracidade da tese da acusação, são comunicações íntimas de ‘Maricas’ a Gabriel, assumindo frequentemente contornos lascivos e dando conta do auxílio pecuniário que o Padre lhe ia dando. O Padre não se mostrou arrependido, dizendo-se grande apreciador do teor das cartas e das qualidades da remetente, que se “lhe aparecesse a dita Maricas ou São Pedro, ele faria seu juizo se havia de estimar mais naquela primeira do que ver São Pedro”.

Suporte dois quartos de folha de papel não dobrados, escritos um no rosto e no verso e o outro apenas no rosto.
Arquivo Biblioteca Nacional de Portugal
Repository Coleções em Organização
Fundo Caixa 106
Cota arquivística Documento 18
Fólios 118r-119r
Transcrição Mariana Gomes
Contextualização Mariana Gomes
Modernização Raïssa Gillier
Anotação POS Clara Pinto, Catarina Carvalheiro
Data da transcrição2010

Texto: -


[1]
Meu Marido todo do meu coracão
[2]
não te poso expelicar o sentimento que me acompanha por te não ter escrevido a tanto tempo mas não me deves tornar culpa pois não tenho estado em vianna
[3]
fui ber minha mai que ja moreu
[4]
olha tu a tristeza com que eu poderei estar de me ber sem minha mai
[5]
agora ja não temos inparo nenhum senão o teu
[6]
dezejarei não nos dezenpares e a mim prinsipalmte pois nesesito mto e não tenho mais ningem senão a ti
[7]
tu não olhes pa o que te dizem de mim pois tudo he mentira
[8]
nem eu quero nada desta gente de vianna
[9]
eu ja a quinze dias que estou em tavora
[10]
e agora chegei aqui tersa fra so pa saber notisias tuas pois la as não tinha e tanta d car te e tinha e todas as cartas que tu me tinhas escrevidas estabam na mão de anna maria
[11]
agora eu assi todas bi
[12]
o que me mandas dizer que pedise ao coreio que me dese hum cruzado novo eu como estava em tavora não lho mandei pedir
[13]
asim que cheigei mandei pedirlho mas ele tinha hido pa a tera e não mo deu
[14]
tu me dizias que ele te disera que eu não tinha presa dele e que te dizera desconfiar de mim
[15]
não teis que ter zelos pois te goardo lialdade e so deos save a nesesidade que eu tinha de dinheiro pois gastei mto com a morte de minha mai
[16]
espero do teu amor me mandes algum dinheiro pois presizo mto dele
[17]
mandamo pelo coreio
[18]
dezejarei tenhas saude pa meu inparo pois não tenho houtra couza senão a ti
[19]
aseita mtos abrasos de minha manna e de mim mtos beiginhos
[20]
adeos meu rico filho
[21]
eu estou mto agoniada com a falta de minha mari.
[22]
e tambem por ti
[23]
aseita mtas saudades do teu coninho e das tuas maminhas que so sam tuas e ham de ser
[24]
adeos
[25]
regalate
[26]
Desta tua molher que mto te ama emthe a morte Maria

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