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Maarten Janssen, 2014-

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1776. Carta de Joaquim de Foios para José Anastácio da Cunha, matemático e poeta.

Author(s)

Joaquim de Foios      

Addressee(s)

José Anastácio da Cunha                        

Summary

Frei Joaquim de Foios elogia a obra do destinatário. A Inquisição resumiu assim o conteúdo do documento: "Carta de Joaquim de Foyos datada em Lisboa a 17 de julho de 1772 em que lhe reprehende de traduzir a oração universal de Pope que contem cousas que não cabem no homem cristão esta faz algua carga ao R[éu]".

Text: -


[1]
Sr Jozè Anastasio da Cunha.
[2]
Não lhe sei encarecer, o qto, muito tempo, desejava boas noti-cias suas.
[3]
O Tenente João Baptista, em que VM tem grande admirador, e hum amigo, que conhece e sabe avali-ar o seu merecimo foi quem me deu noticias individuaes;
[4]
e isto mto por acaso, porque eu não tinha conhecimo algum do tal João Bapta mas vindo aqui à livraria desta casa, me fallou na sua Arithmetica Universal, e me repetio alguns versos, dos que VM tinha feito.
[5]
de-pois me trouxe a Arithmetica e os versos, os quaes a-ctualme parão na ma mão.
[6]
Qto a confissão, que VM faz dos seus erros, creyo que he em pte necessaria, e em parte não.
[7]
E primeirame pelo que toca aos versos, prescindindo da materia, não são in-dignos de apparecer, porque em todos elles são os pensa-mtos verdadeiros, e muito frequenteme nobres e poeti-cos;
[8]
assim a huns sustenta os a verdade, a outros levan-ta os a novidade, a belleza, e ainda a sublimide.
[9]
A Ode sobre a Empresa da Academia de Valencia he hum Dithyrambo, de que gostei muito.
[10]
Os Heroicos, que tem por epigraphe Veritati sacrum contem muita coiza boa e verdadeirame poetica.
[11]
Porem a materia de quasi todos os outros versos não sei eu, nem saberá ninguem desculpar
[12]
corrompe e perde não o Christão, mas ate o homem.
[13]
Sim estão de coizas deste genero cheyas as obras dos poetas, mas a ninguem salvão os peccados dos outros.
[14]
A oração universal de Pope contem coizas, que nem cabem no homem Christão.
[15]
Vejo que VM ha de dizer, que brincava, como poeta;
[16]
porem qdo tornar a trazer a memoria aquelles bons principios, que VM algum dia teve, e pelos quaes escrupulizava ate de abraçar aquelle genero de vida, que não de si máo, mas estava sogeito a alguns perigos de consciencia;
[17]
qdo digo eu, tornar a fazer re-flexão sobre tão bons principios, conhecerá com o claro enten-dimo que tem, que fez mal.
[18]
Porem basta disto, e perdoe toda a molestia, que lhe tenha cauzado.
[19]
Da sua Arithmetica não sou eu, nem posso ser juiz competente.
[20]
Eu não aprendi de Geometria mais que aquella, que julguei preciza para me dar a clareza o entendimo, segurança no raciocionio, e methodo.
[21]
De calculo toquei tanto, qto era necessa-rio pa esta mesma Geometria.
[22]
Assim não passei mto da Algebra e da Geometria Elementar.
[23]
Donde pode estar certo, que aquillo, que vou a dizer, não de homem, que enten-da a materia, mas de quem deseja satisfazer de algum modo ao que me pede na sua carta.
[24]
Isto supposto, digo, que a sua obra he de hum Homem, que tem feito progressos grandes no calculo;
[25]
e suppostos ogs poucos subsidios, que em Portugal pa o adiantamo das sciencias Mathema-ticas, cuido, que disse pouco em dizer grandes.
[26]
Dois livros Livros que eu vi mostrão, que a obra toda conterá mtas verdades e muitos conhecimos que atè agora estavão ocultos a todos os nossos Naturaes, e que entre nós se vay chegando aonde mto tempo chegarão as outras naçoens da Europa.
[27]
Do calculo costumava eu dizer, que era semente, que ou não nacia absolutame ou ao menos não pegava bem, nem se lograva no nosso terreno;
[28]
mas com os conhecimos a que VM tem chegado, e creyo, que à sua imitação chegarão outros, mudarei de linguaguem.
[29]
Este o juizo, que faço da sua obra qto ao seu merecimo absoluto, e a sciencia, que mostra em seu autor: não o faço tão favoravel pelo merecimo que diz respeito aos leitores, e a instrução, que nella podem ter principalme os principiantes, para quem ella se quer inculcar; porque a acho summame conciza, e por conse-quencia quasi no mesmo gráo difficultosa.
[30]
Em dois li-vros pequenos chega VM as Equaçoens do quarto gráo, começando dos primeiros elementos:
[31]
ha obras extensas, como a Arithmetica dos Geometras de Deidier, que sego ma lembrança, não passão das Equaçoens do 3o
[32]
Huma obra elementar he necessario que se detenha em cada huma huma das coizas, e que deduzindo humas das outras não com rigor de demonstração, senão tambem com clareza e evidencia.
[33]
o que se não pode fazer em marcha mto rapida.
[34]
Sei que Descartes censurando o de fazer conciza a sua Geometria respondeo, que não tinha empenho de compor obras grandes nem que as suas fossem intendidas de idiotas;
[35]
porem aquelle Filosofo era hum espirito de invenção raro, e escrevia não para expor o que se sabia das sciencias, mas para descubrir o que se ignorava ainda nellas.
[36]
Este juizo, que eu tinha feito da sua Arithm e communicado ao Tene João Bapta vi que era o mesmo, que depois formou hum tal P. Monteiro, que aqui , e de cuja Mathematica ouço dizer bem.
[37]
eu não o conheço.
[38]
Estimarei que nestes novos estu-dos da Universide o empreguem a VM porque me persua-do, que ha de ficar o publico bem servido, e a VM tiramno da vida mais miseravel, que eu considero, que he a de soldado.
[39]
João Baptista fazlhe neste ponto todos os bons offos de grande amigo.
[40]
Tinha mto mais que dizer, mas for-çoso acabar, se fizer primeiro huma advertencia, que nacerá de escrupulo, e não seria necessaria, e he, que a verdade dos pensamos de que fallo acima, he a verdade precizame practica.
[41]
Ds gde a VM ms as
[42]
Lisboa 17 de Julho de 1776 De VM Criado, amo e apaixonado Joaqm de Foyos

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